Aos poucos, o luto vai virando reflexão. E não adianta mais mandar o Felipão pro inferno, dizer que o Fred é um poste ou especular sobre a contusão do Neymar. Se ele se machucou ou não, pouco importa agora.
O problema do futebol brasileiro é endêmico, estrutural e conjuntural. Volte no tempo: o Santos tomou uma surra do Barcelona no ano passado, o Galo deu vexame perdendo para o inexpressivo Raja Casablanca. Ganhamos uma Copa das Confederações, um torneio insosso que supervalorizamos contra uma Espanha também decadente.
Temos um futebol de quinta categoria, cuja média de público é inferior à liga dos Estados Unidos! Os campeonatos regionais são uma piada. Audax? Barra Mansa? O que é isso? Nossos jogadores são PhD em cair na área para cavar penalti. O tempo de bola rolando nas partidas não chega a 50 minutos, o que contrasta com o alto índice de faltas. Árbitros são mal preparados, não há renovação de quadros no campo ou fora dele. Décadas atrás, podíamos montar três seleções facilmente. Hoje, nem cogitamos questionar os 23 escolhidos de Felipão porque, convenhamos, não tínhamos outros mesmo.
Nossos técnicos estão ultrapassados. Não há variação tática, padrão de jogo, inteligência, nada. Felipão e Cia. nasceram com seu esquema e discurso quixotesco-pachequista ("A Copa é nossa", "Temos que vencer") e vão morrer com ele.
E o que falar dos nossos dirigentes e comandantes? O presidente da CBF rouba medalha e defende a tortura, o treinador tece elogios ao Pinochet e o Parreira, intelectual de orelha de livro, barrou o Barbosa (o bode expiatório do Mundial de 50) de visitar a concentração em 94, alegando que ele não traria sorte. Morreu triste. Pelo menos, foi vingado ontem. Isso sem falar nos Dinamites, Euricos, Amorins, Deleis, Perrelas e tantos outros que usam o futebol como trampolim para política. E com relações promíscuas com torcidas organizadas.
Por falar em torcida, que tal a nossa que não sabe o que dizer? Não sabe porque deixou de enxergar na Seleção um patrimônio nacional. Não sabe porque esvaziou os estádios. Não sabe porque quem vai aos jogos hoje só pensa em brigar, em trucidar. Ou você já se esqueceu do desfecho sangrento do Brasileirão do ano passado entre Vasco e Atlético-PR? Não sabe também porque se preocupa demais em aparecer no telão, fazer selfies e pedir "filma nós" pro Galvão Bueno.
A imprensa tem sua parcela de culpa? Claro. Nossa cobertura esportiva hoje se resume ao esquema treino-jogo temperado pela "thiagoleifertização" do jornalismo: toda matéria tem que ser engraçadinha, bonitinha, esteticamente bem feita. Acabou a análise crítica da estrutura do futebol. Alguns poucos na mídia impressa e na ESPN salvam. O resto? Só espetáculo e oba oba.
Não adianta mais culpar os jogadores. Eles tiveram a dignidade de entrar em campo para sofrer por todos nós. O futebol brasileiro é que deixou de ser digno de alguma coisa.
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